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MARGARIDO (Alfredo). CARTA, dirigida a Mário Cesariny, Paris, 17.11.1986 [data dos Correios], dactilografada, assinada, 2 ff. Extensa carta de Alfredo Margarido, descrevendo e comentando várias actividades literárias. Começa por informar o envio de um “li

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Preço base: €40

Preço estimado: €60

Comissão da leiloeira:

MARGARIDO (Alfredo)
CARTA, dirigida a Mário Cesariny, Paris, 17.11.1986 [data dos Correios], dactilografada, assinada, 2 ff.
Extensa carta de Alfredo Margarido, descrevendo e comentando várias actividades literárias. Começa por informar o envio de um “livrinho” para inclusão em antologia a publicar por Cesariny, livro esse que não identifica – «possivelmente o não incluirás num espaço surrealizante, embora me pareça que tal podia e devia acontecer, se considerarmos as condições específicas dessa escrita, que o Fernando B.J. Martinho rpocurou confiar aos braços, ou às asas tutelares do Ricardo Reis, quando na verdade dependia ele – e tratava-se então de uma forte dependência – do Hoelderlin, que eu descobrira na tradução um pouco áspera do paulo Quintela, e que continuei a ler depois em francês, antes de poder fazê-lo, mesmo se de maneira titubeante, em alemão».
A propósito de umas palavras de Cesariny sobre a “Bailarina” [Um Poema para uma Bailarina Negra], tece Margarido rasgados elogios à poesia de Cesariny e de como ela o influenciou – «Não estou longe de pensar que a 5.ª estrofe seja marcada por uma presença tua: não hesitaria em reconhecê-lo em duas ou três outras passagens, mesmo se dissimuladas. Mas haverá nisso surpresa, melhor dito: haverá nisso razão para surpresas? Não escrevi muito a respeito da tua poesia, mas escrevi alguma coisa, porque ela me marcou como uma possibilidade nova na língua portuguesa, quando ainda se neo-realejava muito, e quando ainda não parecia inteiramente possível escapar a essa marca rubra, por se tratar de uma espécie de condição sine qua non para “combater” o fascismo à portuguesa. […] Era por isso normal que houvesse um eco, um traço, que não a submissão: essa poesia traduzia também um choque profundo, face à África, não a África dos colonos, mas a da invenção dos africanos, entretanto completamente desprezada, e até destruída, pelos europeus».
Sensibilizado pela inclusão do texto na dita antologia, comenta a dúvida de Cesariny entre o título “Poesia surrealista” e “Filosofia surrealista”, ocupando com isso largos parágrafos e tecendo várias considerações de carácter histórico e filosófico àcerca do movimento – «Permite-me sublinhar a importância que teria este segundo título [filosofia surrealista], que me parece corresponder mais ao movimento interno da afirmação poética dos surrealistas dos “grupos” e os surrealistas que, por razões históricas – bastava não morar em Lisboa para não poder integrar o movimento – ou generacionais, não puderam pertencer aos “movimentos”».
Acrescenta Alfredo Margarido um comentário sobre Carlos Eurico da Costa – «Há muitos anos, há mais de trinta, que, de vez em quando, nas tuas relações comigo e com o Carlos Eurico, aparece o fantasma de uma correspondência erótica, que te foi dirigida pelo excluso autor do Requiem, tal como surge também a necessidade de assegurar a publicação da grande poesia do adolescente vianense. Não li o seu último livro, por ter encontrado em duas ou três revistas o diabo de uma poesia militante, inspirada por não sei que regras do PC, que me confrangeu. Lembro-me com horror de um poema consagrado ao Agostinho Neto, que me deixou mais do que perplexo, mas que respeitava as regras internas do neo-realismo, ou do realismo socialista, do poema encomendado. Só que há poetas que conseguem, mau grado a encomenda, assegurar à sua criação um certo equilíbrio trémulo – caso do Aragon ou do Elouard – e outros que não conseguem manter essa dignidade poética mínima: o Carlos Eurico pertence evidentemente a estes autores […]».
E termina, dando conta das suas actividades artísticas no domínio da pintura, descrevendo várias exposições em vários locais e enviando junto uma fotografia de um dos trabalhos para o projecto “Trinta e Três Leituras Plásticas de Fernando Pessoa”.

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