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Destruição de Livros

Na longa história da memória escrita, desde a escrita cuneiforme até à era digital, todos os homens e em todo o tempo lhe reconheceram o enorme valor e importância. Muitos são os testemunhos de verdadeira devoção e até sacrifício pela sua reunião e preservação para as gerações vindouras.

No entanto, nem sempre esse reconhecimento é testemunhado pela acção altruísta de quem acredita que a partilha de conhecimento e de arte é um dos passos fundamentais para a evolução da humanidade como um todo.

Momentos houve na história onde a memória escrita, em particular o livro, foi sujeito à destruição, seja provocada por quem reconhece nele o valor e importância e, por isso mesmo, o receia e deseja apagar, seja por acidentes ou como “danos colaterais”, o que quer que isso signifique.

Partilhamos convosco algumas dessas histórias de destruição de alguns registos da história e da arte da humanidade.

Nem sempre o homem foi o principal agente da destruição. Em 1666 Londres foi destruída por um devastador e misterioso incêndio. Apesar de incríveis esforços por parte de alguns, as perdas foram tais que um historiador num obra recente comparou a perda bibliográfica de 1666 com a perda da Biblioteca de Alexandria (vd. BELL, W. G., The Great Fire of London in 1666).

Entre nós, 1755 é um ano que não esqueceremos por mais séculos que passem. Lisboa via-se destruída e com ela uma grande parte da Biblioteca Real, perdida para sempre.

Neste século, é bastante conhecido o destino dado pela Alemanha Nazi a milhões de livros, a maioria de temática Judaica. A derrota da Alemanha representou uma grande vitória para o mundo, mas, como em todas as guerras, não sem custos humanos e materiais. Os livros também fizeram parte desses custos.

Na noite de 9 de Março de 1943 mais de 500 toneladas de bombas foram largadas em Munique pela Royal Air Force. Tal força destrutiva fez desaparecer cerca de meio milhão de livros da Biblioteca da Baviera, entre os quais a maior colecção de Bíblias então existentes no mundo.

Em Berlim, durante os ataques à Universidade de Berlim, cerca de 20000 volumes ficaram reduzidos a cinzas. Nos sucessivos bombardeamentos de Fevereiro e Março de 1945 a Saechsische Landesbibliothek de Desden perdeu quase 300.000 livros. Os bombardeamentos em Frankfurt arrasaram com a Stadtbibliothek e a Biblioteca da Universidade, perdendo-se mais de 550.000 títulos. E Hamburgo viu desaparecer 600.000 livros entre 1943 e 1944.

Nem nos anos mais recentes, a tentativa de eliminar o registo escrito ficou adormecida. Salman Rushdie é um dos casos mais conhecidos quando, em 1988 publica a primeira edição dos seus ‘Versículos Satânicos’. Em 2001, o Ministro da Cultura Egípcio mandou destruir numa pilha de fogo mais de 6000 volumes da poesia de Abu Nuwas, apesar de ser considerado um clássico da literatura árabe.

Não consigo ficar indiferente quando leio estas histórias de destruição. Mas também não consigo, ao mesmo tempo, de pensar no papel dos livreiros, leiloeiros e extraordinários coleccionadores que em todos os tempos fizeram um esforço, muitas vezes árduo, de preservação deste património único que é o livro. Fazer parte desse lado da história do livro em conjunto com os meus clientes, conforta-me.

Variante

Variante é um termo geral para descrever um exemplar que apresenta algumas variações em qualquer das suas partes em relação a outros exemplares da mesma edição. O seu uso não implica que o exemplar seja uma anormalidade ou possua um defeito de impressão.

O termo deve ser usado apenas quando se põem problemas bibliográficos quanto a prioridades de impressão ou relação entre elas. Por exemplo, um exemplar com uma folha em branco que deveria estar impressa ou um caderno mal encadernado, não é uma variante, mas um erro, um acidente no momento da impressão ou da encadernação. Já a alteração de uma palavra, frase de um texto ou outro elemento, em um ou mais exemplares, constitui uma variante.

Editio Princeps

Expressão latina usada para “primeira edição”. Segundo Carter, o termo é usado pelos mais puristas para as primeiras edições de obras até então conhecidas apenas por manuscritos antes da invenção da imprensa móvel.

Cambão

Cambão é uma expressão que indica a combinação antes do leilão entre duas ou mais pessoas, normalmente profissionais, para que não licitem uns contra os outros, beneficiando mutuamente na descida do preço de martelo ao eliminar a concorrência.

A materialização do benefício manifestava-se de diversas formas. Em mercados mais maduros, depois da aquisição em leilão, os lotes eram leiloados entre si numa venda privada e a diferença entre o valor de aquisição dividido entre os restantes.

Em Portugal, a forma mais comum implicava a cedência de parte a parte nos lotes a licitar ou a deixar sem a venda privada posterior, cada um beneficiando pelo valor não pago nos vários lotes adquiridos e, consequentemente, aumentando as margens de lucro.

Qualquer que fosse a forma, o cambão tinha também efeitos nos outros compradores, como beneficiava todos os que nele participavam, aumentavam a capacidade de lutar contra qualquer outro concorrente.

Segundo John Carter, o cambão tornou-se ilegal em Inglaterra em 1927 e em 1956 a Antiquarian Booksellers’ Association proibiu essa prática aos seus membros. Mas é sabido que a prática perdurou no tempo. Em Portugal, nunca houve um decreto expresso sobre o assunto em leilão e nem mesmo a mais recente legislação lhe faz referência expressa. No entanto, convém lembrar que o cambão se enquadra no âmbito do “cartel”, algo proibido por lei.

Com o advento dos leilões online, estas práticas tornaram-se ainda menos visíveis.